sexta-feira, 31 de maio de 2013

Villafranca Del Bierzo a Alto do Poio (36,4 Km)

Etapa 24 (22/05/12) - dia de lidar com a frustração!

Neste dia "madruguei" e lembrei de uma frase que meu avô dizia quando levantava muito cedo da cama: "Deu formiga na cama Keje?" rsrsrsr. Após alongamentos, o relógio apontava 06:30 Hs e ainda estava escuro... Esperei por 10 minutos até clarear para minha saída...
Esta etapa foi caracterizada por possuir muitas localidades umas próximas das outras, não distando mais que 5 Km entre elas, isto até os 20 Km iniciais. Logo na saída peguei um considerável trecho margeando uma autopista.
E começaram os povoados... Primeiro Pereje, onde parei para fazer um lanche no Centro de Turismo Rural Las Coronas, funciona também um bar; tinha uma pessoa só para atender muitos peregrinos que chegaram de vez - verdadeiro exercício de paciência. Enfrentei isso várias vezes no Caminho...uma vivência necessária!

Trecho com muitas castanheiras e carvalhos...
Agora Trabadelo... povoação de uma rua só.

Parei na entrada de La Portela, bem em frente à estátua de Santiago Peregrino, onde tinha uma placa desejando Buen Camino e indicava que só faltavam 190 Km para Santiago de Compostela... pela primeira vez senti que minha jornada estava acabando, bateu um misto de tristeza e alegria ao mesmo tempo, que sensação estranha!


Em Ambasmestas procurei o dono de uma banca que estava vendendo souvenirs, mas ele não apareceu... que pena, pois queria comprar um botton para presentear uma peregrina sueca que passara por mim logo cedo... 

Em Vega de Valcarce passando pelo antigo Albergue do Brasil ou Albergue Nossa Senhora de Aparecida, o qual era administrado pelo brasileiro Itabyra. Atualmente o albergue é administrado por outra pessoa, e mudou de nome, chama-se Albergue El Roble.


No povoado de Rutelán parei para lanchar no Meson Albergue Sarracin. Foi o suco de laranja mais caro do Caminho, numa dessas que pedi algo sem perguntar antes o quanto custava... o preço? deixa pra lá, nem tirei foto da hospedaria/bar de tão retado que fiquei!

Na entrada do povoado de Las Herrerías encontrei um senhor sentado num banco. Cumprimentei-o e fiquei a observar por alguns minutos o seu ofício em fabricar, pacientemente, cajados de avelã. Segui caminho...
Na foto abaixo, alcançando a senhora sueca e trocando umas ideias, ou melhor, tentando, pois ambos arrastávamos o inglês.
Logo na saída da población é que realmente começa a tão falada subida ao Cebreiro... serão longos 7,5 Km.
No asfalto, a indicação assegurando que estava no caminho certo...


Foram 3 Km de subida com dificuldade mediana, até chegar em La Faba - pequeno povoado com uma dezena de casas.
Começaram a chegar alguns brasileiros próximo a uma fonte d'água. Tinha a opção de pernoitar na localidade, mas como ainda era cedo, subimos montanha cada um no seu ritmo...
Daí por diante foram cerca de 4 Km de íngreme subida...
Atenuada por lindas paisagens...
Entrando na Galícia!
Enfim o Cebreiro... Estava a 1400 metros de altitude! Numa aldeia extremamente mística e cheia de  magia, mistérios e beleza. Sonhei e planejei muito pernoitar aqui...
Me dirigi imediatamente ao único albergue existente para me acomodar...
Estava na companhia do Alexandre(BH), entramos na fila, foi quando saiu um americano esbravejando: "Full, full"...  o albergue, com capacidade para 104 peregrinos, estava em reforma e limitado para 42 pessoas, e, naquele exato momento, tinha acabado de completar a sua lotação... foi uma ducha de água fria!
Ainda percorremos rapidamente a aldeia à procura de vagas em hostais e casas rurais existentes, mas estavam lotados, pois o local é muito turístico.
Bastante frustado, sentei-me um pouco para contemplar a paisagem... aquele sorriso meio sem graça para a foto (rsrsrsrs)... o sentimento de frustração era grande, o desejo e a expectativa em pernoitar neste local foram gerados com tanta intensidade que não conseguia conter este sentimento... aqui novamente tive a certeza que o Caminho nos leva, não basta você programar a sua trajetória, o Caminho também tem as suas adversidades e temos que aceitá-las, e não teria sido o destino? Naquele momento só pensava na frustração, mas hoje acredito que fez parte do meu crescimento pessoal. 
Fiz um pequeno lanche num dos bares do centro da aldeia... com forte comércio de souvenirs durante o dia.
Observei muitas palhoças de tradição celta, construídas justamente para abrigar pessoas, protegendo-as das duras condições climáticas do local. São casas ovais, feitas de pedras e com tetos de palha.

Um dos mistérios do local é que ali teria acontecido o Milagre Eucarístico do Cebreiro.... Em 1250, caía um forte temporal e o sacerdote já pensava que ninguém viria à missa, quando um camponês, se dirigiu ao Cebreiro para escutar a missa, como de costume. O sacerdote ao vê-lo murmurou com desprezo: Como vem este homem debaixo desta tempestade, cansado, apenas para ver um pouco de pão e vinho!”
Na missa, no momento da consagração o pão e vinho converteram-se em carne e sangue. Os Reis Católicos da Espanha, peregrinos em 1486, quando conheceram o milagre doaram o relicário que se encontra junto ao cálice no Santuário de Santa Maria.


Na saída, não deixei por menos, fui contemplar novamente a bela visão que o Cebreiro nos proporciona...
Que vontade de ficar!
Por desatenção, peguei o caminho destinado aos ciclistas, margeando a carretera... mas sem problemas, aliás, o problema residia em caminhar mais um trecho que não estava planejado.... teria que andar mais 8,5 Km para o local do pernoite. Refazer a nossa programação era parte do Caminho... aceitar isso foi muito bom para mim!
Após 3 Km de descida apareceu Linares... duvidam que estava na Galícia? rsrsrsrs

Na saída, absorto com medo das vacas, as quais nem me incomodaram.... tomei um susto imenso foi com um pastor alemão, que latiu vindo para cima de mim, ainda bem que estava preso... o coração veio à boca, mas foi só um susto! rsrsrsrsrs
Depois vieram algumas pequenas descidas...

Passei pelo Alto de San Roque, a 1.270 metros de altitude, onde tem um monumento em homenagem ao peregrino.
O monumento reflete realmente o local... muito vento! igualmente ao peregrino imortalizado na estátua, tive que segurar meu boné para que os fortes ventos não o levasse!

Aqui numa localidade chamada Hospital, conta com um albergue somente, mas já estava lotado... 
Parei para comprar uma maçã nesta caminhonete/quitanda que estava parada...
Daí em diante foi só subida... 

Ainda bem que as minhas panturrilhas não reclamaram. Sem nenhuma dor, apenas algumas bolhas apareceram.

Finalmente, exausto e após 36,4 Km, cheguei ao Alto do Poio, a uma altitude de 1335 metros.

Acreditem, mas esta localidade se resume ao seguinte: um albergue, uma casa rural e mais três casas. E o mais importante: a tranquilidade que o silêncio do alto da montanha propicia!
Fiquei no Albergue Del Puerto Bar - privado, capacidade para 16 peregrinos, ao custo de 10 euros, numa habitação com quarto duplo. Conforto que não usufruía há muito tempo no caminho. rsrsrsrs
Eram 20 horas e os peregrinos descansavam em frente ao albergue, após uma longa jornada... vejam a cara de cansaço de cada um... nada que uma cama e um bom sono não renovassem as energias para o dia seguinte.

Ao ir dormir, ainda fui brindado por esta magnífica visão do pôr do sol...